segunda-feira, 29 de julho de 2013

Férias e tempo livre

Eduardo Mattos Cardoso

Professor Mestre em História


Numa lógica capitalista, comercial e consumista cada vez mais essa época de inverno é associada á férias. Para uma minoria ainda, é claro. Essa prática está associada mais a centros urbanos. Em nossa cidade, fora as férias escolares, falar em férias de meio de ano é sinônimo de “vagabundismo”. Em Três Cachoeiras, diferentemente de quase todo o resto do mundo, se faz greve para trabalhar mais!

Segundo o filósofo Renato Bittencourt, as longas jornadas de trabalho são cada vez mais aceitas na sociedade moderna, criando uma dependência do trabalhador. Caprichosamente articulados, férias e feriados nas empresas (e outros lugares de trabalho seja público ou privados) têm um intuito certo: deixar os cidadãos apáticos, culpados e cada vez mais ávidos em trabalhar.

É a vida para o trabalho. Para Renato, o trabalho regido pela ordem capitalista em sua frieza tecnocrática se torna apenas um recurso para que o sujeito possa obter o ganho mínimo para a manutenção de sua existência, em verdade, uma subvida. De outro lado, ser empreendedor individual não foge a esse estado. Manter um padrão de vida às vezes é doloroso. Trabalho e mais trabalho. Mais horas extras.

Mas o trabalho é para dar prazer? Tradicionalmente não. A escravidão pelo mundo a fora que nos diga. Um olhar sobre a etimologia da palavra trabalho é esclarecedora: se origina do termo latino “tripalium” que significa instrumento de suplício. E hoje, a divisão técnica da produção e a sua crescente mecanização geram na subjetividade do trabalhador uma contínua repulsa pelo seu objeto profissional, tornando sua atividade maçante, incapaz de lhe proporcionar verdadeira satisfação existencial.

Carl Marx apontou que “o trabalhador se torna tanto mais pobre quanto mais riqueza produz, quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão”. Contemporaneamente em troca de dinheiro. E cada vez mais dinheiro. O trabalhador vende seu metabolismo e sua vida interior proporcionalmente ao sucesso econômico da empresa.

Nem sempre foi assim. Conforme o sociólogo Domenico de Masi, autor de O futuro do Trabalho (José Olympio Editora), “na Atenas de Péricles havia mais feriado que dias úteis”. Eram dias de cultos, celebrações, musicais e reflexões. Daí resultou uma das maiores civilizações dos últimos tempos. Para esse autor, “tratava-se do ócio elevado à condição de arte”. Esses gregos! Infelizmente hoje, alienadas pelo sentimento de culpa, as pessoas levam trabalho até para casa nas horas de folga e fins de semana.


Artigo publicado no jornal O Fato em Foco no dia 26 de julho de 2013.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

O bode

Eduardo Mattos Cardoso

Professor Mestre em História


De tempos em tempos aparece uma novela boa. Quando era bem pequeno lembro-me de uma que se chamava “Que rei sou eu”. A história se passava num reino fictício. Lá pelas tantas teve eleição. E a maioria do povo escolheu, adivinhe quem, o “Bode Zé”. Era um protesto. Mas era emblemático.

O bode é um animal muito importante no nordeste semiárido brasileiro. Devido sua resistência naquele ambiente seco. Mas a palavra bode pode ter sentido pejorativo na linguagem popular. Além do que pode significar confusão. Ainda tem o bode expiatório que é o indivíduo que paga pela culpa alheia.

Numa sociedade altamente hipócrita como a nossa o caprino expiador está em todas. O culpado é sempre o outro, ou outra pessoa. Nunca eu. Parciais são os outros. Em lugares onde a perfeição é aprimorada há bode para tudo. Nossa cidade é exemplar nesse quesito.

Como as novelas andam ruins, prefiro a da Câmara de Vereadores de Três Cachoeiras. É mais emocionante. Já que a Secretaria de Educação e Cultura não sabe o que é Educação e muito menos Cultura sobra o capítulo legislativo semanal. Pelo menos não é um monólogo. Embora tentem o fazer.

O vereador biônico está tentando fazer a sua parte. Mas é complicado. O último capítulo antes do recesso parlamentar (nome bonito para férias) de meio de ano foi diferente. Teve a participação especial de secretária e funcionária para falar e esclarecer dúvidas sobre a perda dos R$300.000,00 e consequentemente do futuro ginásio municipal ao lado da escola Angelina Maggi.

Mais uma tentativa de explicar o inexplicável e tirar o corpo fora. Da incompetência à inocência existe uma separação muito tênue. Para o ouvinte desavisado os discursos com palavras bonitas impressionam. Mas não há nada de novo. Pura empulhação. Dos nove vereadores um não perguntou nada. Adivinhe? Quem paga a conta?

Como poucos neste município tem capacidade e hombridade de assumir erros, o que esperar de nossos funcionários públicos “boquistas”? A diferença de “Que rei sou eu” para Três Cachoeiras é que naquela novela o “Bode Zé” não assumiu o cargo, é claro. Mas em nosso município aconteceu o contrário. Resumo da ópera: como incompetência não se assume (é sempre culpa de outro) e devido a “forças superiores” ficou fácil para o dr. falastrão narrador decretar a existência de um bode expiatório que de tão expiatório foi até promovido. Essas “forças superiores”...! Deu bode.

Artigo publicado no Jornal O Fato em Foco no dia 19 de julho de 2013.

segunda-feira, 15 de julho de 2013


Sobre crítica e sandálias

Eduardo Mattos Cardoso

Professor Mestre em História


Na cidade “que pode mais” é muito difícil debater sobre política e o que é público. Sempre tem uma turma rançosa e incompetente de plantão. Para maquiar a verdade. Não gostam de crítica ou a ignoram. Não gostam de números, comparações. Por isso escondem o que podem. Não gostam de informação precisa. Abrir contas públicas então, nem se fala. Dizem que vão fazer diferente, mas aprimoram o que ainda existe de mais atrasado na sociedade.

É cansativo tentar dialogar com ignorante mal educado e maldoso. Claro, eles têm que puxar saco até debaixo d’agua. Até entendo. Como são incapazes e não tem autonomia (um mal da humanidade), precisam manter seus empregos (públicos e privados) ou “bocas” a todo custo. Agora, empulhar a população como “arautos da novidade” agride a mínima inteligência. O objetivo, é claro, é tomar o que é público para o interesse privado. Detestam pobres. Para essa turma, tudo o que é benefício social tem que ser cortado.

Numa coisa eu concordo com os administradores municipais. Esse negócio de avaliar “100 dias” ou “6 meses” de governo é uma bobagem. Como afirmaram os vereadores governistas: quem é que pediu avaliação? É óbvio que se avalia desde o 1º dia de governo! Só o que faltava é essa moda pegar por aqui: 100 dias, 6 meses, 1 ano... Se o prefeito concede aumento de 44% para secretários a partir do 1º dia de governo e esnoba R$ 300.000,00 num município “quebrado”, alguma coisa está errada. Por isso a avaliação é permanente.

Mas os rancorosos de plantão, como não tem capacidade de estabelecer um debate de auto nível se escondem no lato sensu. Espalham bobagens, fofocas e maldades. Seus cérebros não aguentam qualidade. Detestam concurso público. Então ficam na mediocridade diária e anestesiada. Esbravejam quando são contrariados. Ai o ranço aumenta ainda mais. É um ciclo interminável.

Infelizmente inauguraram a política do rancor, do ódio e intolerância. E o que é pior, estão contaminando a sociedade local como um todo. E o que é pior ainda, as novas gerações. Apresentam-se como pessoas sérias, justas e idôneas. Na prática mostram-se muito diferentes. Sorrateiras, adeptas do jeitinho, da artimanha, do toma-lá-dá-cá. O que esperar de uma cidade governada e sustentada por pseudogovernantes e que se autointitulam competentes. Ter um projeto de cidade para a maioria poderia ser um começo. E usar as “sandálias da humildade”. Ainda dá tempo.

Artigo publicado no Jornal Fato em Foco no dia 12/07/2013