terça-feira, 17 de setembro de 2013


Mistérios

Eduardo Mattos Cardoso

Professor Mestre em História



Alguém já ouviu falar em Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip)? Estas organizações estão frequentemente ligadas a escândalos nacionais de corrupção, como o desta semana na operação Esopo deflagrada pela Polícia Federal. Em Três Cachoeiras também existe Oscip. Conveniada com a prefeitura municipal. Em tese serve para terceirizar funcionários. Em tese. Sua atuação de fato é misteriosa.

Outros mistérios também pairam sobre nosso município. Esse pessoal que está no governo, tanto no executivo quanto no legislativo gosta de segredos. Desconversam quando questionados sobre o que foi feito com o R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) arrecadado a mais do que o previsto em maio e junho. Silêncio. Ou enrolação. Segundo o prefeito - competente apertador de mãos - o município continua “quebrado”. Aprendeu rápido com o chefe. Não sabe de nada, não pode fazer nada e não manda em nada. Sempre, quando a coisa aperta, cai fora com a desculpa de que tem que consultar os oráculos. Ufa!

Não menos enigmática é a relação mídia-religião-política em nossa cidade. Somos sabedores que toda concessão de radio é pública. Então deve ser de interesse público. Não particular. E vivemos num estado laico. Isso significa que esses princípios não são muito observados por aqui. Se essa mistura provocasse o surgimento de bons agentes públicos, menos mal. Entretanto, o que se vê é a “fabricação” de políticos semianalfabetos e analfabetos funcionais prestando um grande desserviço à sociedade trescachoeirense. Nesse caso, o mistério é o que vem pela frente.

E a nossa Câmara de Vereadores. Continua uma “caixinha de surpresas”. Para engolir os mandos e desmandos da mesa diretora, só com bola de cristal. O andar se dá conforme a vontade dos ventos, ora sul, ora nordeste ou minuano. É fácil empulhar a turma sem debatedor a altura, pois o nível quase geral dos edis é muito baixo. Além disso, continua o mistério das prioridades. Explico: se gasta mais tempo nas sessões ordinárias com projetos de nomes de ruas do que qualquer outro. Na última, o tempo de votação de projeto de nome de rua foi infinitamente superior ao da aprovação do Plano Plurianual (PPA) que hoje menciona um orçamento de R$ 76.000.000,00 (setenta e seis milhões de reais) para os próximos quatro anos.

Junto com todos esses mistérios, um não poderia faltar. E anda intrigando muita gente: o Ministério Público esqueceu Três Cachoeiras. Uns falam em forças superiores ou até abdução. Outros que é coisa de sociedades secretas.

Artigo publicado no jornal O Fato em Foco do dia 13 de setembro de 2013.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Magistério

Eduardo Mattos Cardoso
Professor Mestre em História


Mais uma greve do magistério estadual. Entre outros motivos, pelo cumprimento da lei do piso nacional do magistério. É o principal motivo. Mas e o novo ensino médio politécnico? Já ouviram falar? Será golpismo educacional? Para melhorar números? Por enquanto apenas isso. No papel é maravilhoso. Na prática... Veio de cima e as escolas engoliram. Sem nenhum debate. E ponto.

Segundo o IBGE, o Rio Grande do Sul é - depois da Bahia e do Maranhão - o terceiro estado que mais “expulsa” seus habitantes. Estamos no padrão norte/nordeste. Na Bahia a culpa é dos Magalhães. No Maranhão dos Sarney. E por aqui, a culpa é de quem? Mas dizem que os motivos são outros. Será? O tal Estado mais politizado e de boa qualidade de vida do país esta mostrando sua cara. Faz tempo.

Em mês “farroupilha” poderíamos começar a pensar nessas coisas. O que queremos para o futuro do nosso estado? A continuação da mediocridade? Da falsidade? Da enganação? Fazer de conta que temos “tradição”, “orgulho” e sermos “modelo” como diz nosso hino enquanto na prática funciona o contrário?

Enquanto alguns médicos não querem R$ 10.000,00 de “bolsa” - porque querem carreira de estado e ganhar mais de R$ 20.000,00 como juízes, e com razão - em termos salariais só estamos lutando para que o governador Tarso Genro cumpra uma lei que ele mesmo assinou quando era ministro da educação. Que cumpra a lei do piso, que hoje estabelece em salário básico de R$ 1.567,00 para início de carreira para um professor(a) com 40 horas semanas com nível médio.

A façanha mais modelar de nossos administradores é a covardia. E nosso governador é mais um desses. Enganou não só os professores, mas a população do estado inteira, com exceção é claro, dos privilegiados de sempre. Não presenciei nas últimas duas décadas um governador capaz de enfrentar o legislativo e a maior chaga existente em nosso estado e país: o judiciário. A “judicialização dos direitos sociais”, como nomeou Roberto DaMatta, é um câncer devastador que corrói o desenvolvimento do país. Nosso governador não tem coragem de enfrentar “os donos do poder”. E em 2014 seremos empulhados novamente. Por um ou por outra.

Ademais, junte-se a isso a covardia de alguns colegas. Uns, partidarizando o sindicato da categoria estadual. Outros, nas próprias escolas fazendo promoções pessoais, conchavos e todo tipo de ajeitamento possível para trabalhar menos e fugir de sala de aula. Viva a individualidade. Viva a covardia.


Artigo publicado no jornal O Fato em Foco no dia 6 de setembro de 2013.
EM GREVE: QUERO SER MAIS COBRADO!


Bernardo Caprara
Sociólogo, Professor e Jornalista


Estou em greve para ser mais cobrado. Essa sentença pode soar estranha. É isso mesmo. Logo você irá entendê-la. O fato é que o magistério estadual está sem trabalhar, de acordo com o direito exposto no artigo 9º da Constituição Federal. Poucos gostam de fazer greve. Corre-se o risco de ficar sem receber. As aulas serão recuperadas, talvez nos sábados, talvez no verão. Mas a greve permanece um importante instrumento de pressão política. Goste-se ou não.

O economista Amartya Sen é reconhecido pelo Nobel que recebeu. Em uma das suas instigantes obras, ele argumenta que a expansão das liberdades é o principal fim e o principal meio para o desenvolvimento. A ausência de educação e saúde de qualidade para todos restringe a expansão das liberdades. Nesse sentido, observei na minha dissertação de mestrado, entre outras coisas, que o efeito estatístico da escola no desempenho estudantil carrega um significado decisivo – resultado consoante com a literatura da sociologia da educação contemporânea.

Se já salientei a relevância da educação e do sistema escolar, do ponto de vista das ciências humanas e sociais, sob a ótica da política institucional tal relevância parece não sair do discurso. Há muito tempo. É inacreditável que o atual governo gaúcho, responsável pela criação de um vencimento básico mínimo para os professores, agora rejeite por completo a aplicação da sua cria. Cintila inacreditável a situação física da grande maioria das escolas, na medida em que, a cada eleição, a educação pública surge como um mantra na boca dos candidatos e na estratégia dos marqueteiros. Triste cenário.

Reuni-me com alguns dos meus estudantes, no intuito de escutar as suas demandas. Elas são múltiplas. Desde questões pontuais até elementos estruturais, passando por críticas, sim, ao modus operandi dos docentes. Dizem eles que os educadores faltam muito, são despreparados, não têm paciência, demonstram claros problemas pedagógicos e assim por diante. Relatam, ainda, que os colégios são desorganizados, não oferecem a possibilidade de protagonismo aos discentes, destilam autoritarismo e não os deixam bater as suas asas e voar rumo ao conhecimento. Reclamam da modificação do ensino médio, que retirou uma série de períodos de matemática, geografia, história e outras disciplinas. Sentem-se inferiorizados
frente à rede privada em qualquer concurso que possam disputar. Eu assino embaixo e sublinho que tudo isso faz parte do ensino público cotidiano.

Na última avaliação publicada pelo PISA (Programme for International Student Assessment), o Brasil ficou em 57º num ranking de qualidade educacional composto por 65 países. Um péssimo resultado para uma das maiores economias do planeta. Com Pós-Doutorado na Université de Montreal e na Pennsylvania State Unversity, Bernardete Gatti coordenou um estudo da UNESCO em que demonstrou ser fundamental a valorização dos professores. Sem melhores remunerações, os melhores profissionais não se interessam ou logo abandonam a carreira. E a corda estoura por todos os lados.

Abri esta pequena reflexão propondo que estou em greve para ser mais cobrado. Desafio os governos a oferecer condições adequadas para que eu e meus colegas possamos exercer o nosso apaixonante ofício. Sem que, transcorridos alguns anos, estejamos todos doentes e desestimulados. Sem que alguém tenha pena de nós por atuarmos na educação básica. Que nos cobrem, então, muita qualidade e excelentes performances. Até que cheguem estes lindos dias, continuarei ensinando (e aprendendo) da melhor maneira que consigo. Dotado da máxima dedicação que me cabe. Não aceitarei, contudo, cobranças densas e profundas daqueles que mentem para o povo e não fazem da educação uma legítima prioridade.



Artigo publicado no blog do Juremir Machado da Silva

terça-feira, 3 de setembro de 2013


Sobre salários e estruturas


Delmar Bertuol

A Secretaria Estadual de Educação contrata estudantes para darem aula. Sim, acadêmicos de licenciatura a partir do 4º semestre (em muitos casos isso é menos da metade do curso) podem dar aulas para até o Ensino Médio no Rio Grande do Sul. Por que o Estado contrata esses estudantes e lhes dá regência de classe? Porque muitos profissionais formados não querem trabalhar na Educação Básica Estadual. E por que não querem? Porque o Estado paga mal.

O Governo Federal está contratando médicos estrangeiros formados para atuarem no interior do Brasil. Por que o Governo Federal está importando esses profissionais? Porque muitos médicos brasileiros não querem trabalhar no interior. E por que não querem? Porque preferem ficar nos grandes centros urbanos, onde ganham o mesmo salário.

Um professor em fim de carreira no Rio Grande do Sul, depois de talvez ter sofrido algumas agressões físicas e com certeza ter sofrido diversas agressões morais ganha no máximo, chutando alto, R$ 3.500,00. Um recém contratado ganha metade disso.

O Governo Federal está oferecendo salário de R$ 10.000,00 para os médicos atenderem no interior. Os “doutores” acusam o Estado de escravidão.

Os hospitais não têm infraestrutura adequada e faltam materiais.

Nas escolas, ocorre o mesmo fenômeno.

Quando eu estava no 4º semestre fui Professor no Estado. Meus colegas me receberam com alegria. Disseram-me que há tempos faltava Professor de História, que eu fosse muito bem-vindo.

Um médico cubano não no 4º semestre, mas formado, foi recebido com vaias pelos novos colegas brasileiros. Disseram que ele era desnecessário aqui.

Muitos idealistas defendem que o salário de um professor deveria ser no mínimo de R$ 10.000,00. Uma Lei Nacional garante R$ 1.500,00. O Rio Grande do Sul não cumpre a lei. Se os professores entram em greve reivindicando isso e melhor infraestrutura nos educandários, são tachados de desocupados. Sabiam que a vida de professor era miserável. Por que aceitaram trabalhar nisso?

Muitos idealistas defendem que os médicos deveriam ter uma Carreira de Estado, tal quais juízes e promotores. Claro que o salário se equipararia. Mais de R$ 20.000,00. Se um professor guardasse seu salário por um ano, chegaria fácil fácil nessa cifra. Quando os médicos fazem greve reivindicando isso e melhor infraestrutura nos hospitais, são aplaudidos pela média conservadora. São heróis.

Testo de opinião do blog do Juremir Machado da Silva