domingo, 4 de agosto de 2013

Tempos líquidos

Eduardo Mattos Cardoso

Professor Mestre em História



O título de hoje faz referência a uma das obras do sociólogo polonês Zygmunt Bauman. Em “Tempos líquidos” o autor entra profundamente no submundo da insegurança principalmente nas grandes cidades. Terrorismo, crime organizado, desemprego e solidão são fenômenos típicos de uma era na qual a exclusão e a desintegração da solidariedade expõem o homem aos seus temores mais graves.

Para Bauman, o desmonte dos mecanismos de proteção aos menos favorecidos, somado aos efeitos incontroláveis da globalização, propiciou um ambiente inseguro por definição. Dessa forma, as cidades se tornam o local por excelência das ansiedades. Os fabricantes de antidepressivos à base de lítio comemoram. “Construídas para fornecer proteção a todos os seus habitantes, as cidades hoje em dia se associam com mais frequência ao perigo que à segurança”, afirma o autor.

Por isso, segundo o sociólogo, é no medo que se baseia a legitimidade da política contemporânea, incapaz de alcançar a origem global dos problemas, o que acaba por alimentar, ainda mais, as angústias da vida na modernidade líquida que é a condição em que as organizações sociais não podem mais manter sua forma por muito tempo, pois se decompõem e se dissolvem mais rápido que o tempo que leva para moldá-las e, uma vez reorganizadas, para que se estabeleçam.

De fato, poder e política estão separados. Os políticos são reféns da falta de poder. Já são eleitos sabendo disso. Mas se prestam para isso. Grande parte do poder de agir efetivamente, antes disponível ao Estado moderno, agora se afasta na direção de um espaço global politicamente descontrolado, enquanto a política (que deveria ser a capacidade de decidir a direção e o objetivo de uma ação) é incapaz de operar efetivamente na dimensão planetária, já que permanece local.

Assim, o Estado incapaz de conceber os serviços essenciais aos cidadãos é pressionado a terceirizar suas obrigações, abrindo campo fértil para as forças do mercado. Com isso “a exposição dos indivíduos aos caprichos dos mercados de mão-de-obra e de mercadorias inspira e promove a divisão e não a unidade, estimulando as atitudes competitivas”, frisa o autor. É um dos ingredientes da instalação do medo.

Ao contrário do medo, a segurança passa pelos direitos dos indivíduos. Nesse sentido Zygmunt Bauman é categórico em afirmar que “não podemos estar seguros de nossos direitos pessoais se não formos capazes de exercer direitos políticos e fizermos essa capacidade pesar no processo de elaboração das leis”. Eis a dita participação: será que somos capazes ou não temos mais forças?


Artigo publicado no Jornal O Fato em Foco no dia 02 de agosto de 2013.